domingo, 25 de novembro de 2012

Por uma cidade sustentável, para ciclistas e bicicleteiros.



Ary Soares (*)

(Artigo publicado no Jornal Hoje http://www.ohoje.com.br/pageflip/2213/index.html - pagina 4, em 25.11.2012).

Nos dias 5 e 27 de outubro de 2011, publiquei no HOJE (em Opinião), minhas percepções e opiniões sobre aspectos de nosso transito e transporte público. Retomo agora com outro tema correlato: Mobilidade, abordando a bicicleta como meio de transporte.
Percebe-se uma positiva mudança na forma de gestão da cidade. Ciclovias, ainda que de formas experimentais e pontuais, começam a ser implantadas. O ritmo dessa implantação pode e vai melhorar, afinal, o prefeito reeleito baseou seus compromissos de campanha na sustentabilidade e para que alcance o prometido, um dos caminhos é investir em transporte e mobilidade.
Fui bicicleteiro em Goiânia por alguns anos, parte deste tempo usei a “magrela” ou “aranha” para fazer o deslocamento de casa para o trabalho. Outra parte, uns três anos, a usei como ferramenta de trabalho. Cruzava a cidade sob sol ou chuva, de leste a oeste, de norte a sul, pedalando. Ela, a bicicleta, neste período, foi a grande responsável por meu salário, afinal como cobrador eu era comissionado, o rendimento financeiro, era resultado direto de outro rendimento, o esforço físico.
Estou retomando agora a bicicleta como meio de deslocamento no trajeto: casa-trabalho-casa. Comprovo, infelizmente, uma antiga avaliação: Goiânia, que apresenta boas condições para uso deste meio de transporte, com poucas declividades a exigir um maior empenho do bicicleteiro, ainda não esta pensada para este público.
O que temos até o momento, são iniciativas que, timidamente, buscam atender o ciclista. Explico: ciclista, por minha conceituação, é aquele que tem na bicicleta um meio de lazer e esporte, bicicleteiro, é aquele tem na bicicleta seu meio de transporte cotidiano ou de ganha-pão. O ciclista, muitas das vezes, coloca a bicicleta no carro e se desloca ao local que lhe oferece condições de uso, por exemplo: segurança. O bicicleteiro já sai de casa pedalando.
Proponho aqui, alternativas a meu ver simples e de baixo custo de implantação, dentre elas, que seja definido algumas ruas paralelas a eixos de transporte e nessas ruas impor formas de uso que privilegiem o bicicleteiro, exemplo: transformar a Rua 115 (paralela a Marginal Botafogo) em via de mão única (uma parte dela já é!) e definir como exclusiva ou prioritária uma das faixas hoje destinadas a estacionamento, para uso de ciclistas e bicicleteiros, adicionando nesta formula limite de velocidade aos veículos motorizados que por ali continuaram a transitar.
Idêntico ao exemplo da Rua 115, a cidade oferece inúmeras alternativas de conexão paralelas a outros eixos de transporte. Espero mais ousadia do Governo Municipal, para fazer de Goiânia uma cidade aprazível e segura para o uso de bicicletas. Goiânia, uma cidade sustentável, precisa trilhar este caminho.

(*) Ary Soares é Especialista e Mestre em Geografia e Analista Ambiental do IBAMA em Goiás aryssantos@hotmail.com

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Transporte coletivo, relatos de um dia.


Artigo publicado no jornal O Hoje (http://www.ohoje.com.br) em 27/09/2011

Transporte coletivo, relatos de um dia.

Recentemente, após ficar livre de tantas agendas em um mesmo dia, em decorrência da função representativa que por vários anos tive frente ao IBAMA, me vi aliviado de obrigações outras e, portanto, com horários a serem preenchidos, ao menos por enquanto como eu bem queira, me propiciou abrir mão do carro. Tal perspectiva me levou a retomar uma prática há muito em desuso: o uso do transporte coletivo.
Saindo de uma atividade na Câmara Municipal, onde fui rever amigos que lidam com a gestão ambiental, dirigi-me ao primeiro ponto de ônibus da Avenida Goiás. Depois de vários minutos observando e procurando por alguma informação escrita sobre linhas e roteiros dos coletivos, resolvi interpelar outros usuários sobre que linha atenderia minha demanda (chegar às confluências das avenidas 85 e T-63). Na terceira ou quarta tentativa fui informado que o ônibus que me atenderia não passava onde eu estava, e sim, na rua 68. Era por volta das 14 horas, sol a pino, resignei, desloquei-me rumo à rua 68. Postei-me frente há um ponto de ônibus ao lado do Mercado do Setor Popular.

Ali, questionei a uma usuária se naquele ponto parava “meu” ônibus, ela não soube informar. Perguntei ainda sobre como pagar a passagem, se o motorista venderia o tal “sit-pass”, ela disse-me que não, que eu deveria adquirir antes do embarque. Ela ainda disse-me que, “possivelmente”, uma das bancas do mercado venderia o sit-pass. Perambulei por várias, até que um dos lojistas me informou que “já houve, mas não há mais venda de sit-pass no mercado”. Achei por bem me deslocar até a Avenida Paranaíba, imaginei que por ser ali um corredor de maior movimento de coletivos, encontraria ao menos um vendedor ambulante que me socorresse. Nada, nenhuma viva alma que prestasse tal serviço por ali estava.

Não me dei por vencido, na cara dura, adentrei ao ônibus que atendia minha pretensão de retorno para casa. O motorista gentilmente me informou que uma determinada banca/lanchonete ao longo da Avenida Tocantins venderia o ambicionado sit-pass. Entre os três pontos viajei ali: entre a catraca e a porta de entrada, atrapalhando e sendo empurrado por aqueles que já detinham o bilhete de passagem. Desci no local indicado pelo motorista, tentei comprar uma passagem. Tive que comprar duas, pois era o bilhete mínimo a venda. Sorte que o dinheiro não estava assim tão “contadinho”. Paguei, recebi o troco e voltei ainda a tempo de adentrar no mesmo ônibus que me “dera carona” até ali.

Dentro do ônibus, me sentido aliviado, pois estava rumo a minha casa, fiquei avaliando e me sentido um privilegiado. Estava eu, transitando do centro para um bairro também central (Setor Bela Vista). Não dependeria de passar por um “terminal-de-passageiros”; não estava transportando qualquer volume ou criança (uma mãe, sentada próxima onde eu estava em pé, tentava manter calma uma criancinha que imaginei ter entre 10 meses e um ano de vida). O calor, mesmo com janelas abertas, era quase insuportável. Deu pena daquela mãe, fiquei preocupado com a criança.

Tais relatos exprimem o imenso desafio que nossas autoridades e especialistas em mobilidade urbana tem pela frente. Fazer uso deste semi-abandonado meio de transporte de massa, como sempre fez o ex-governador do Rio do Grande do Sul, Olívio Dutra, pode, se não induzir caminhos para solução em curto prazo, ao menos propiciar maior sensibilização para que sejam buscadas soluções de fato para o transporte coletivo.

Fico na dúvida se campanhas como “o dia mundial sem carro”, não faria mais sentido se fosse “o dia mundial do transporte coletivo”.

Ary Soares dos Santos
Analista Ambiental do IBAMA em Goiás

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Bichos de estimação, quem tem cuida!


Bichos de estimação, quem tem cuida!

                                                         Por: Ary Soares dos Santos (*)


Qual seu bicho de estimação? Um cachorro! Esta provavelmente seria a resposta mais comum em uma hipotética pesquisa junto à população brasileira. Gatos provavelmente viriam em segundo. Entretanto, dado a grande biodiversidade que o mundo dispõe, trata-se de raciocínio altamente especulativo elaborar uma lista de quantas espécies animais estão em posse da população humana.

Cachorros e gatos, assim como todos os animais “irracionais” adotados como bichos de estimação, foram antes de domesticados, silvestres. Foram necessários séculos de convívio para que se alcançasse o padrão de convivência quase simbiótica que temos no momento. O ser humano ao longo de sua presença na face da Terra sempre foi afeiçoado a tudo que a natureza proporciona.

Difícil entender como foi constituído o preconceito em volta de alguns determinados apegos por certas espécies de animais. Ressalto aqui, o estigma que, por exemplo, ronda criadores de pássaros. Pássaros, independente da espécie, assim como os mamíferos cachorros e gatos, tem origem na natureza. As matrizes em geral não nasceram domesticadas. Em algum momento, por motivos diversos, foram retirados da vida silvestre e adaptados ao convívio humano.

Técnicas atuais propiciam, a partir de matrizes legalmente estabelecidas, a multiplicação de indivíduos, propiciando assim que os aficionados por inúmeras espécies possam adquirir seu animal de estimação de origem legal. Guardadas as proporções, assim como alguém compra um filhote de cachorro ou gato em uma loja, este também pode comprar um pássaro para obter o mesmo objetivo, ou seja, um bicho de estimação.

Ainda tentando entender o preconceito que ronda tais criadores, poderíamos aqui elencar inúmeras espécies que também são legalmente comercializadas e criadas. Apenas para ficarmos em dois exemplos, cito: peixes (os ornamentais, criados em aquários); repteis (iguana é uma delas, alguns criam cobras). Enfim são centenas as espécies que ao longo do tempo foram conquistadas ou conquistaram a paixão humana.

Ironicamente, muitos dos que condenam criadores de pássaros, tem em seu domínio um cachorro; um gato; um aquário com peixes ou outra espécie. Estes, conceitualmente, do ponto de vista do “animal de estimação” não mantém qualquer diferença ante ao dono de um pássaro. Cachorros e gatos passaram por melhoramentos genéticos, cruzando se espécies diferentes, gerando inclusas, novas espécies. Pássaros têm passado por processos semelhantes, nascidos sob domínio de criadores, que tiveram acessos legalmente a matrizes, são oferecidos hoje, varias espécies, que assim como outras espécies de bichos, tem cumprido o papel de fazer companhia ao ser humano.

O combate a ilegalidade é e deve continuar sendo obrigação de nossas políticas de proteção à vida silvestre, e deve contar com o apoio da sociedade. O respeito ao direito daqueles que optaram por adquirir legalmente e criar seu pássaro ou qualquer outra espécie animal, deve ser respeitado, pois o fazem dentro dos princípios legais. Aqueles que se arvoram na condenação preconceituosa dos “bichos de estimação”, alegando dentre outras questões amor à liberdade das espécies, deve ter em mente, que sua própria existência, é resultado do conflito secular entre nós humanos e o ambiente natural que nos antecedeu.

Alias, conceituados pesquisadores, vêem na criação comercial de animais silvestres, uma importante estratégia conservacionista, visto que reduz assim, a pressão sobre animais na natureza.

Em tempo: meu bicho de estimação é um cachorro da raça shitzu. Resido em um apartamento. E você, qual seu bicho?



(*) Mestre em Geografia, Analista Ambiental do IBAMA em Goiás.

terça-feira, 3 de julho de 2012


Artigo publicado no caderno Opinião de O Popular em 01/07/2012

Praça Cívica e outros ambientes urbanos
                                                         Por: Ary Soares dos Santos (*)


Enfim, a Praça Cívica será reurbanizada. Ótimo, o local que abriga boa parte da história de Goiânia, como o nosso primeiro e único palácio, há muito fazia por merecer a atenção do poder público. Com certeza, sua reforma também assimilará e será assimilada pelo importante acervo em art decó instalado dentro e nas suas imediações.

Entretanto, dando coerência à uma lei da física, a de que “toda ação provoca uma reação de igual ou maior intensidade que a ação original”, nem todos estão vendo com bons olhos a reforma. Uma das razões da reação é a supressão da área de estacionamento em que aquela praça se transformou.

Os reclamantes, que possuem carros e ali os estacionam, tem razão em reclamar. Atualmente quando muito, remuneram com gorjetas os “flanelinhas” que apropriaram daquele espaço. Findo o estacionamento, terão que fazer uso dos estacionamentos privados. Os estacionamentos atuais, além de caros, são poucos. Obviamente que vão inflar seus preços com o inicio das obras que se promete para breve.

Observador da cidade, e testemunho dos conflitos que aqui se digladiam, vejo as informações preliminares da dita reforma com preocupação e decepção. Preocupação por, em minha avaliação preliminar, a reforma estar-se focando apenas no embelezamento cênico do ambiente. Decepcionado por mais uma vez, perder-se a oportunidade de ali e em outros ambientes, se instalar áreas de multiuso.

No presente caso, todo o ambiente ao nível do solo que esta se projetando, como fontes, jardins e outros itens, poderia ser conciliado há um projeto de engenharia mais arrojado. Ser a parte aparente de um empreendimento maior.

Defendo que deveria ser contemplado, dentre outros usos, a construção de vários níveis de estacionamento subterrâneos. Com isso, poderia se suprimir todos os estacionamentos nas laterais das ruas e avenidas daquela imediação. Destinando este espaço para corredores exclusivos de transporte coletivos e ciclovias. Dar-se-ia uma grande contribuição não somente ao transito, mas também à mobilidade urbana.

Imaginem ainda, quantos milhões de litros dágua oriundos de chuvas poderiam ser estocados em um depósito abaixo desse estacionamento subterrâneo? Água essa, que no primeiro momento, evitaria a sobrecarga que atualmente tem provocado transtornos nos momentos de pico de chuvas, visto que a impermeabilização não propicia seu necessário escoamento. Água essa também, que com técnicas simples de filtragem e armazenamento poderia ter usos diversos nos intervalos entre chuvas, como irrigação ou para limpeza de ambientes, até mesmo uso em lava-jatos que ali também poderiam ser instalados.

Antes que digam que não há recursos financeiros para tal “megalomania”, sugiro que consultem nossos empreendedores imobiliários sobre o custo que será a aquisição de um terreno e a construção de estacionamentos como vem sendo pensado pelos defensores da reforma. Acredito que empresas que lidam nesta área, teriam razoável interesse em obter a concessão do Estado para administrar o subterrâneo da praça por um determinado período, responsabilizando incluso, por implantar o projeto que aqui provoco, desonerando o Governo deste custo.

Os usos dos espaços públicos precisam urgentemente ser repensados. Defendo que temos que ser intransigente na defesa de transporte público de qualidade, mas desconsiderar a necessidade de espaços adequados para o transporte privado, longe de ser uma solução, contribui tão somente para ampliar ainda mais o caos na cidade. Uma cidade pode ser bonita, sem abdicar de administrar seus conflitos.



(*) Mestre em Geografia, Analista Ambiental do IBAMA em Goiás.

domingo, 17 de junho de 2012

Artigo publicado em O Popular em 17/06/2012 (http://www.opopular.com.br/cmlink/o-popular/editorias/opiniao/rio-20-1.165865)

Ary Soares dos Santos

Rio+20

Ary Soaresdos Santos 17 de junho de 2012 (domingo)
A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio+20, em andamento na cidade do Rio de Janeiro, atrai a atenção do mundo. Não é para menos. Questões globais que têm pautado outras conferências similares serão, dessa vez no Brasil, novamente dissecadas. Possivelmente, assim como em outras conferências patrocinadas pela ONU, esta terminará com declarações de governos, de que fizeram o que podiam, e com manifestações de cidadãos, de que faltou vontade política para resolver questões que colocam a Terra na rota de um fim trágico.
Conciliar interesses contraditórios em um mundo que ciclicamente tem vivido autos e baixos em sua economia tem se mostrado tarefa impossível de ser alcançada. Economia que se apresenta como mola-mestra que impulsiona e tenciona governos e cidadãos mundo afora. Quando em alta, solapa recursos naturais de nações que baseiam sua sobrevivência na exportação extrativista, na pecuária e agricultura. Quando em baixa – a exemplo da Europa atualmente – arrasta as mesmas economias que a alimenta para sua mesma crise, pois reduz suas compras, e força o desemprego e seus efeitos deletérios. É o modelo econômico vigente. Sempre repetitivo, por mais dinâmico que seja.
Temas globais, como mudanças climáticas – para ficar apenas no mais contundente e polêmico –, devem pautar a maior parte dos debates. Oxalá termine a Rio+20 com acordos válidos e programáticos entre as nações participantes. Grandes secas e catastróficas enchentes, que assolam campo e cidades ano após ano, estão a requerer mais do que fundamentações científicas. Estão a exigir decisões e ações governamentais.
Em outra frente, não devemos nos desvincular de uma grande máxima: pensar globalmente, agir localmente. Por mais que nos preocupam os problemas do mundo, é preciso que vivamos o ambiente que habitamos. Como nos esquecermos de doenças como a dengue, que afetam milhares de pessoas em nossa cidade a cada ano? Como deixar de fazermos uma autocrítica sobre nosso comportamento, muitas vezes omisso e leniente sobre a questão urbana?
Resgato a questão da dengue com o objetivo de expor nossas contradições. Queremos e merecemos um ambiente harmonioso, de preferência límpido e, se possível, que exale bom cheiro. E nós, cidadãos comuns, muitas vezes não estamos fazendo nossa parte. A dengue é prova disso. Lixo descartado em locais impróprios; quintais com ou sem piscinas maus cuidados e por aí vai. Podemos elencar uma série de “pequenos pecados” que cometemos no dia a dia. Geralmente culpamos os governantes. É mais cômodo, nos exime ou redime, em parte, nossa culpa.
Sim, queremos e devemos lutar por um mundo melhor. Mas primeiro é preciso que contribuamos para termos uma cidade melhor. Sucesso para a Rio+20: isso podemos desejar. Se queremos qualidade de vida em nossas cidades, precisamos participar.
 
Ary Soares dos Santos é mestre em Geografia e analista ambiental do Ibama em Goiás. aryssantos.goiania@gmail.com

quinta-feira, 24 de maio de 2012

O Código Florestal e Milton Fries: dois fatos, fatos tristes!


Artigo publicado em 24.05.2012 no Jornal O Hoje, pagina 4 (http://www.ohoje.com.br/pageflip/2029/index.html)
                                                                                            

O Código Florestal e Milton Fries: dois fatos, fatos tristes!

Por: Ary Soares dos Santos (*)
                                                            
Em datas recentes, tivemos dois fatos, dois fatos tristes, ambos com aparente distinção e isolados entre si. Um, a votação do Código Florestal na Câmara Federal, outro, o falecimento do produtor rural Milton Fries. Digo aparente, porque na prática tais fatos mantiveram entre si, relevante conexão.

Segundo opiniões de alguns senadores, a Câmara Federal desconsiderou “acordo de lideranças entre as casas”, ao impor modificações no texto, que contava já com o aval do Governo. Ainda não se sabe se haverão vetos por parte do Governo, o que é constitucionalmente possível, obviamente, com perdas e ganhos políticos entre ambos, ainda difíceis de serem mensurados. Conforme o dito popular, “quem viver verá”.

Milton Fries foi um dos grandes empresário do agronegócio no estado de Goiás. Ele vinha dando provas aos que ainda conflitam sobre o texto ideal para o futuro código, que é plenamente possível produzir e preservar, isto, sob o prisma do código vigente. Suas propriedades, no município de Mineiros, ano após ano, apresentam altos índices de produtividade. Todas elas têm seguido rigidamente, os limites permitidos pela legislação ambiental.

Alem de cumprir com suas obrigações ambientais, Fries foi além, criou a RPPN Nascentes do Rio Araguaia, unidade de conservação privada de elevada importância estratégica para o Cerrado, que propicia a re-conexão do Parque Nacional das Emas com o Rio Araguaia. Ali, ele foi além de suas obrigações legais, pois abriu mão do direito de produzir em área que não era Reserva Legal e nem de Preservação Permanente, aliás, parte dessa área, era anteriormente ocupada com plantio de grãos e criação de gado. Nesta e em outras áreas que ele se propôs a preservar e ou a melhorar o nível de qualidade ambiental, já foram plantadas milhares de espécies nativas. São dezenas de nascentes protegidas, contribuindo para um ambicioso projeto ambiental, o Corredor de Biodiversidade Rio Araguaia.

O Corredor de Biodiversidade Rio Araguaia, iniciativa público privada, idealizado pelo Instituto Onça-Pintada, IBAMA/GO, IDESA e ERTWATCH, tem como princípio a participação efetiva de propriedades rurais produtivas. Fries era o patrono deste projeto.

Ele, Fries, foi um dos proprietários do entorno do Parque das Emas que pactuaram com o IBAMA e o Ministério Público Federal, o Programa de Regularização de Áreas de Reserva Legal e de Preservação Permanente – PROLEGAL, iniciativa que propiciou a adequação ambiental de dezenas de grandes propriedades rurais naquela região, e que vem, gradativamente, melhorando a qualidade do entorno daquela unidade de conservação.

Ainda não se sabe se, e quais, os artigos do texto do código aprovado pela Câmara Federal serão vetados pela Presidenta Dilma. Movimentações pró e contra tal medida, estão sendo articuladas por movimentos situados ao centro, direita e esquerda do espectro político e das representações sociais organizadas. Pena que pessoas como o senhor Milton Fries não tenha sido convidados a externar suas opiniões ao Governo e aos nossos parlamentares. “Conservacionistas” e “ruralistas” teriam muito a ganhar com o exemplo de sustentabilidade ambiental e econômica que ele orgulhosamente vinha expondo a quem visitava suas propriedades.

Dizem que: “a palavra convence, mas o exemplo arrasta”. Espero que os exemplos que Milton Fries estabeleceu, sejam mantidos por seus familiares e absorvidos por seus vizinhos e sociedade em geral. Ele deu provas que é possível preservar e produzir. Isto, sem se aprisionar a utopia da conservação total, e nem ser prisioneiro da hipocrisia da produção a qualquer custo.

(*) Mestre em Geografia (UFG), Analista Ambiental do IBAMA em Goiás.

domingo, 22 de abril de 2012


Artigo publicado em O Popular (Opinião, pg 09), em 22/04/2012

Goiânia rediviva
Por: Ary Soares dos Santos (*)

Por questões diversas, dentre elas, inchaço populacional e crescimento desordenado, fenômenos que vicejaram em gestões administrativas ao longo da historia da cidade, Goiânia viu seu plano original ser drasticamente alterado. Entretanto de certa forma, ela, Goiânia, tem dado mostras que não aceitou perder ao menos parte do DNA nela fundido por um de seus geneticistas: o arquiteto Atílio Correia Lima.

Readequar-se ao seu plano original obviamente está totalmente fora de qualquer que seja o plano político de seus próximos administradores. Como imaginar esta conurbada metrópole do Cerrado se adequar aos projetados 50 mil habitantes imaginados por seus idealizadores? É possível, no entanto, com políticas de médio e longo prazo, resgatar parte de seu plano original. Felizmente, estamos presenciando ao menos parte disso.

Ao que me recorde, foi especialmente após a gestão do Prefeito Darci Acorsi, eleito em 1992, que a cidade passou a vivenciar experiências urbanísticas que passaram a levar em conta o resgate de parte de seu plano original. Isso tornou compromisso de todas as gestões subsequentes. A criação de parques ambientais passou desde então a compor os programas públicos. Um marco dessa retomada é o Parque Vaca-Brava, incrustado em uma das regiões de maior densidade populacional da cidade.

Após ele, o Vaca-Brava, as administrações seguintes, de forma combinada ou não, mantiveram a salutar disputa em entrar para a história, como aquela que maior colaboração deu para fazer de Goiânia “a capital mais verde do país”. Ganha a cidade, ganhamos nós!

Além dos inúmeros parques ambientais que foram e continuam sendo criados, nossos gestores passaram também a ter maior respeito com os fundos de vales. Dentre outros investimentos, políticas de remoção de moradores que habitam essas “áreas de risco” tem sido associadas a todos os programas de habitações populares. Tais políticas, além de ser elemento básico para o resgate dessas áreas, propiciam maior dignidade aos moradores que são relocados. Estamos longe do ideal da cidade que queremos, mas basta compararmos Goiânia com outras cidades de porte semelhante que se perceberá o quanto ela e seus habitantes tem ganhado com isso.

Retomando o arquiteto Atílio Correia Lima, e os administradores recentes, ressalto aqui o projeto de maior envergadura: Macambira-Anicuns. Este projeto, além de resgatar parte dos ideais de Atílio, comprova a tese da continuidade administrativa que temos experimentado neste quesito. Independente do prefeito ou partido no comando, no contexto ambiental, tem havido, apesar da enorme distancia ao plano original, uma busca da qualidade que Pedro Ludovico sonhou para nossa Capital. Uma Goiânia que resgate sua proposta de cidade planejada. Uma Goiânia rediviva. Este deve ser o compromisso de todos!

(*) Mestre em Geografia (UFG), Analista Ambiental do IBAMA em Goiás.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Meio Ambiente e Cidadania (considerações sobre a Lei Complementar 140/2011)

Artigo publicado em O Popular (http://www.opopular.com.br/cmlink/o-popular/1.632) em 10.02.2012
Ary Soares dos Santos (*)
A Lei Complementar 140/2011, em vigor desde 09/11/2011, é um marco na consolidação do Sistema Nacional de Meio Ambiente, o SISNAMA.
              Salvo aspectos gerais e já consolidados no âmbito das normas que regem as competências legais dos entes federados, especialmente àquelas vinculadas à Lei 6.938/1981 e aos conflitos de competências que foram realçados pela Constituição de 1988. Ela, a LC 140, cria agora, mecanismos legais para que a segurança jurídica se estabeleça para aqueles que de alguma forma, lidam com recursos naturais.Meio Ambiente e Cidadania (considerações sobre a Lei Complementar 140/2011)
Conforme preconizado no Artigo 3º. da referida LC 140, a mesma visa garantir meios para se “proteger, defender e conservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, promovendo gestão descentralizada, democrática e eficiente”. Muito bom, visto que a descentralização de execução dentre os entes federados de nossa política ambiental tem sido há tempos, motivo de conflitos políticos e econômicos entre os entes públicos que competentes para tal.
Dentre outros males, avalio que tais conflitos, contribuíram até hoje, para o famigerado “custo Brasil”, visto que o empreendedor que sempre dependeu de alguma forma de uma licença ou mesmo uma orientação qualquer para se relacionar com estas “competências federativas”, sempre foi o elo fraco, ficando a mercê de interpretações jurídicas que além de onerar seus custos, faziam com que o mesmo não tivesse qualquer garantia de prazos para obtenção de respostas aos seus protocolos.
Obviamente, a presente lei é uma orientação em muitos aspectos ainda geral, mas traz em si o mapa da paz para uma gestão ambiental qualificada. Exemplo disso: ela possibilita que os municípios de menor porte econômico, que sempre alegam incapacidade de constituir uma equipe técnica à altura das demandas ambientais, se articulem em “consórcios” ou que firmem “convênios, acordos de cooperação técnicas e outros instrumentos similares com órgãos e entidades do Poder Público”. Visando assim, bem cumprir suas obrigações constitucionais. Dentre outras oportunidades, se poderá doravante, constituir uma equipe de licenciamento e fiscalização multidisciplinar entre vários municípios com baixo custo a cada um dos consorciados.
A LC 140/2011, resgata e empodera instituições de apoio à gestão ambiental que na prática já não mais existiam: as comissões tripartites e bipartite. Fóruns legítimos e democráticos de soluções de eventuais conflitos de competência que porventura, ainda subsistam.
A definição do caráter de supletividade é outro importante componente da Lei em questão. Da forma como ficou estabelecido, a postergação de decisão ou tomada de responsabilidade do ente federativo ante a determinada ação, ou omissão, facililita doravante, tanto ao Ministério Público Estadual, quanto ao Federal, agir na sua responsabilização. Aquele que porventura persista em se esconder por trás do limbo que até o momento se caracterizava na gestão ambiental, pela falta de clareza da competência para agir, terá agora que ser mais precavido. Isto é um forte elemento de fortalecimento do SISNAMA
Para o empreendedor, dentre outros avanços, a previsão legal de que: “As exigências de complementação oriundas da análise do empreendimento ou atividade devem ser comunicadas pela autoridade licenciadora de uma única vez ao empreendedor, ressalvadas aquelas decorrentes de fatos novos”, é a garantia de que ele não mais ficara naquela eterna idas-e-vindas, se sujeitando a interpretações em alguns casos pessoais e até mesmo ideológicas de técnicos, apresentando uma nova complementação a cada momento para obter sua almejada licença ambiental. Cabe agora, ao órgão competente pela emissão da licença, ter um bom termo de referência para nortear suas exigências legais, sob o risco de licenciar sem as devidas garantias técnicas, ficando assim, sujeito a dar explicações aos órgãos de controle externo.
Outra inovação, que muito embora, se constitui entre as medidas mais polêmicas, contida nesta Lei, é a competência de lavratura do Auto de Infração, pois: “Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada”. Em síntese, por mais falho que venha a ser um determinado licenciamento, de uma represa de rejeito industrial por exemplo, e esta vier a ruir, provocando dano ambiental, somente terá validade, o auto de Infração lavrado pelo licenciador. Neutraliza-se dessa forma algumas quedas-de-braço que comumente ocorriam nesses eventos, aonde um ente federado, agia de forma espontânea ou até mesmo provocado pelo MPE ou MPF para punir o infrator, desconsiderando e/ou isentando das devidas responsabilidades, o órgão licenciador, responsável em principio, a sanar seus eventuais equívocos.
Portanto, salvo a necessidade de se resolver algumas pendências, como por exemplo, as tipologias dos licenciamentos, esta Lei pode até trazer certa sensação de perda para órgãos de maior musculatura orgânica, como o IBAMA e alguns órgãos estaduais, mas é um caminho sem volta para que o SISNAMA definitivamente se consolide.
(*) Analista Ambiental do IBAMA/GO, especialista e mestre em Geografia. aryssantos@hotmail.com