quinta-feira, 13 de junho de 2013

Transporte coletivo, alternativas.

Publicado no Jornal O Hoje (http://www.ohoje.com.br/pageflip/1800/index.html - edição de 05/10/11, pagina 4)

No ultimo dia 27, publiquei nesta coluna, artigo intitulado “transporte coletivo: relatos de um dia”. Externei naquele momento parte das dificuldades cotidianas daqueles que por opção ou por falta, tem nesse meio de mobilidade uma alternativa. Recebi de alguns leitores considerações que reafirmaram minhas observações quanto à experiência vivida. Retomo aqui o tema, agora submetendo uma proposta que imagino, possa contribuir na reflexão pela busca de soluções.
Sem entrar aqui de forma aprofundada nas estatísticas, temos que, somente em Goiânia circulam aproximadamente um milhão de veículos. Indo direto ao ponto (não ao ponto de ônibus, ao menos por enquanto...) se taxarmos esta frota com fins específicos para melhora das bases do transporte coletivo, faremos uma revolução em poucos anos, acredito.
Criar uma nova taxa, seja lá para o que for, é sempre visto como um ato impopular, especialmente em um país como o nosso que tem, segundo economistas, uma das mais pesadas cargas de impostos do mundo. Mas atenção, o que proponho aqui não é imposto, é uma taxa a ser aplicada exclusivamente sobre veículos automotores não utilizados em transportes coletivos.
Imaginem que se estabelecermos que cada veículo motorizado passe a pagar uma bagatela de em média R$ 100,00 (cem reais) ao ano para este fim, um milhão multiplicado por 100, resultaria em 100 milhões de reais ao ano. Tais valores, por princípios democráticos poderiam ser distribuídos por uma média de paridade por potência do veículo, poder-se-ia iniciar com um piso de R$ 50,00 até um limite de R$ 200,00, mesmo assim acredito que chegaríamos facilmente a este valor. (Proponho que técnicos da área de estatística articulem melhor números, especificações e valores).
Segundo estimativas recentes, o modo de transporte coletivo conhecido por VLT (Veículo Leve sobre Trilho), que se encontra em estudo para implantação em Goiânia, custará entre 20 a 30 milhões de dólares por km, nesta singela conta, a cada ano apenas com esta taxa, poderiam ser implantados até 5 km desta modalidade de transporte. Este valor, oriundo da taxa aqui proposta, entrando como contra-partida de recursos de governos, poder-se-ia no mínimo duplicar, duplicando também a quilometragem a ser implantada.
A proposta não é isentar os diferentes níveis de governo de suas responsabilidades, mas sim, propiciar à sociedade, formas de contribuir de forma objetiva na solução do problema. Aliás, tais recursos, se a taxa for aprovada, deve ser administrado por um colegiado e não pelo Governo. Será um recurso da sociedade e não deverá ter o carimbo de “verba pública”.
Um transporte coletivo de qualidade (segundo especialistas) contribui para tirar milhares de veículos individuais das ruas (seus proprietários passam a ter no transporte coletivo uma alternativa de fato viável e não apenas uma manifestação política aos moldes do retumbante fracasso: “um dia sem carro”). Por outro lado, aqueles que de fato dependem do uso de carro, passam a ter um trânsito bem menos estressante, e a economia que se alcança na diminuição do desgaste do veículo, gasto com combustível e maior facilidade de estacionamento, supera com sobras um pequeno investimento como aqui proposto ao longo do ano.
De minha parte fica a proposta que, obviamente, carece de aprofundamento e consulta pública. Quem dentre nossos representantes políticos levantará esta bandeira?

Ary Soares dos Santos

Analista Ambiental do IBAMA em Goiás, Especialista e Mestre em Geografia.

terça-feira, 19 de março de 2013

Chuvas não é sinônimo de catástrofe





Publicado no jornal O Popular, Caderno Opiniao, em 27-01-2003


Ary Soares dos Santos (*)

O monge beneditino d. Eric James Deitchman, norte-americano de nascença e goiano por opção, dedicou a maior parte de sua vida tentando conciliar as ambições humanas com a manutenção dos aspectos ecológicos, costumava dizer que “(...) uma das poucas coisas que recebemos inteiramente de graça são as águas das chuvas, e não as valorizamos (...)”.
Dom Eric viveu em Mineiros, Sudoeste de Goiás, onde levava a efeito seus atos monásticos. Viveu como poucos o pretenso desenvolvimento sustentável. Teve indiscutível contribuição no desenvolvimento econômico da região, lutou pela valorização do ser humano e foi pioneiro na defesa ambiental. Ele criou e presidiu a Fundação Emas e defendia, com conhecimento de causa, uma moratória para o cerrado: desmatamento zero.
O início, ou melhor, o transcorrer de cada estação chuvosa renova sempre a saudade de d. Eric. Não valorizamos as chuvas, e as mesmas, ano após ano redundam sempre em catástrofe mundo afora e o Brasil se mantém fiel neste noticiário.
Deslizamento de encostas, rios e córregos transpondo seus leitos. Fenômenos previsíveis que provoca efeitos colaterais que bem conhecemos: rodovias bloqueadas, pontes arrastadas, plantações inundadas, moradas destruídas. Perda de vidas humanas se associam quase que automaticamente a estes acontecimentos, que resultam em grandes prejuízos financeiros a particulares e ao governo em seus mais diferentes níveis.
O noticiário comprova que tais eventos não são exclusividade brasileira. China, Estados Unidos, Europa enfim, o mundo convive com estes aspectos da natureza. O Brasil, por suas dimensões físicas, riquezas naturais e leis ambientais existentes poderia ser diferente, deve ser diferente.
Detemos uma extensão física invejável – “somos um dos maiores países do mundo”. esta área associada a condições naturais ímpares, nos posiciona como um país megadiverso em riqueza biológica. A área física em si deveria ser suficiente para um planejamento habitacional, onde no mínimo fossem evitadas as tais “áreas de risco”. Se evitaria assim, entre outros dissabores, perdas humanas. Por outro lado tais áreas não sendo ocupadas, contribuiriam para uma maior sobrevida de nossa flora e fauna. Ganharíamos duas vezes. Praticaríamos de fato, parte do que preconiza uma boa política ambiental.
As leis ambientais necessitam de pouco ou de nenhuma adequação. Ela, por si só já é uma espécie de contrato social. Falta, infelizmente, determinação em cumprir tal contrato. Entre tantas cláusulas, este contrato social é claro na defesa dos aspectos sociais ao proibir a ocupação de áreas de risco, visto que tais áreas são nada mais, nada menos, que as denominadas áreas de preservação permanente (encostas com acentuada declividade; nascentes e margens de córregos e rios são algumas das áreas contempladas neste quesito).
Este ato: a defesa inconteste das áreas de preservação permanente, como dito, já previsto em lei. É apenas um exemplo de como o mero cumprimento da lei já seria um importante atenuante, tanto na proteção de natureza, quanto na proteção de seres humanos.
O respeito à inexorabilidade previsível da resposta da natureza às nossas formas de uso e ocupação, são vitais para que deixemos de freqüentar o noticiário enquanto catástrofe. Tempo chuvoso, não é tempo ruim como é noticiado. Ruins são nossas práticas sócio-ambientais.
(*) analista ambiental do Ibama/GO