quinta-feira, 24 de maio de 2012

O Código Florestal e Milton Fries: dois fatos, fatos tristes!


Artigo publicado em 24.05.2012 no Jornal O Hoje, pagina 4 (http://www.ohoje.com.br/pageflip/2029/index.html)
                                                                                            

O Código Florestal e Milton Fries: dois fatos, fatos tristes!

Por: Ary Soares dos Santos (*)
                                                            
Em datas recentes, tivemos dois fatos, dois fatos tristes, ambos com aparente distinção e isolados entre si. Um, a votação do Código Florestal na Câmara Federal, outro, o falecimento do produtor rural Milton Fries. Digo aparente, porque na prática tais fatos mantiveram entre si, relevante conexão.

Segundo opiniões de alguns senadores, a Câmara Federal desconsiderou “acordo de lideranças entre as casas”, ao impor modificações no texto, que contava já com o aval do Governo. Ainda não se sabe se haverão vetos por parte do Governo, o que é constitucionalmente possível, obviamente, com perdas e ganhos políticos entre ambos, ainda difíceis de serem mensurados. Conforme o dito popular, “quem viver verá”.

Milton Fries foi um dos grandes empresário do agronegócio no estado de Goiás. Ele vinha dando provas aos que ainda conflitam sobre o texto ideal para o futuro código, que é plenamente possível produzir e preservar, isto, sob o prisma do código vigente. Suas propriedades, no município de Mineiros, ano após ano, apresentam altos índices de produtividade. Todas elas têm seguido rigidamente, os limites permitidos pela legislação ambiental.

Alem de cumprir com suas obrigações ambientais, Fries foi além, criou a RPPN Nascentes do Rio Araguaia, unidade de conservação privada de elevada importância estratégica para o Cerrado, que propicia a re-conexão do Parque Nacional das Emas com o Rio Araguaia. Ali, ele foi além de suas obrigações legais, pois abriu mão do direito de produzir em área que não era Reserva Legal e nem de Preservação Permanente, aliás, parte dessa área, era anteriormente ocupada com plantio de grãos e criação de gado. Nesta e em outras áreas que ele se propôs a preservar e ou a melhorar o nível de qualidade ambiental, já foram plantadas milhares de espécies nativas. São dezenas de nascentes protegidas, contribuindo para um ambicioso projeto ambiental, o Corredor de Biodiversidade Rio Araguaia.

O Corredor de Biodiversidade Rio Araguaia, iniciativa público privada, idealizado pelo Instituto Onça-Pintada, IBAMA/GO, IDESA e ERTWATCH, tem como princípio a participação efetiva de propriedades rurais produtivas. Fries era o patrono deste projeto.

Ele, Fries, foi um dos proprietários do entorno do Parque das Emas que pactuaram com o IBAMA e o Ministério Público Federal, o Programa de Regularização de Áreas de Reserva Legal e de Preservação Permanente – PROLEGAL, iniciativa que propiciou a adequação ambiental de dezenas de grandes propriedades rurais naquela região, e que vem, gradativamente, melhorando a qualidade do entorno daquela unidade de conservação.

Ainda não se sabe se, e quais, os artigos do texto do código aprovado pela Câmara Federal serão vetados pela Presidenta Dilma. Movimentações pró e contra tal medida, estão sendo articuladas por movimentos situados ao centro, direita e esquerda do espectro político e das representações sociais organizadas. Pena que pessoas como o senhor Milton Fries não tenha sido convidados a externar suas opiniões ao Governo e aos nossos parlamentares. “Conservacionistas” e “ruralistas” teriam muito a ganhar com o exemplo de sustentabilidade ambiental e econômica que ele orgulhosamente vinha expondo a quem visitava suas propriedades.

Dizem que: “a palavra convence, mas o exemplo arrasta”. Espero que os exemplos que Milton Fries estabeleceu, sejam mantidos por seus familiares e absorvidos por seus vizinhos e sociedade em geral. Ele deu provas que é possível preservar e produzir. Isto, sem se aprisionar a utopia da conservação total, e nem ser prisioneiro da hipocrisia da produção a qualquer custo.

(*) Mestre em Geografia (UFG), Analista Ambiental do IBAMA em Goiás.