sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Meio Ambiente e Cidadania (considerações sobre a Lei Complementar 140/2011)

Artigo publicado em O Popular (http://www.opopular.com.br/cmlink/o-popular/1.632) em 10.02.2012
Ary Soares dos Santos (*)
A Lei Complementar 140/2011, em vigor desde 09/11/2011, é um marco na consolidação do Sistema Nacional de Meio Ambiente, o SISNAMA.
              Salvo aspectos gerais e já consolidados no âmbito das normas que regem as competências legais dos entes federados, especialmente àquelas vinculadas à Lei 6.938/1981 e aos conflitos de competências que foram realçados pela Constituição de 1988. Ela, a LC 140, cria agora, mecanismos legais para que a segurança jurídica se estabeleça para aqueles que de alguma forma, lidam com recursos naturais.Meio Ambiente e Cidadania (considerações sobre a Lei Complementar 140/2011)
Conforme preconizado no Artigo 3º. da referida LC 140, a mesma visa garantir meios para se “proteger, defender e conservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, promovendo gestão descentralizada, democrática e eficiente”. Muito bom, visto que a descentralização de execução dentre os entes federados de nossa política ambiental tem sido há tempos, motivo de conflitos políticos e econômicos entre os entes públicos que competentes para tal.
Dentre outros males, avalio que tais conflitos, contribuíram até hoje, para o famigerado “custo Brasil”, visto que o empreendedor que sempre dependeu de alguma forma de uma licença ou mesmo uma orientação qualquer para se relacionar com estas “competências federativas”, sempre foi o elo fraco, ficando a mercê de interpretações jurídicas que além de onerar seus custos, faziam com que o mesmo não tivesse qualquer garantia de prazos para obtenção de respostas aos seus protocolos.
Obviamente, a presente lei é uma orientação em muitos aspectos ainda geral, mas traz em si o mapa da paz para uma gestão ambiental qualificada. Exemplo disso: ela possibilita que os municípios de menor porte econômico, que sempre alegam incapacidade de constituir uma equipe técnica à altura das demandas ambientais, se articulem em “consórcios” ou que firmem “convênios, acordos de cooperação técnicas e outros instrumentos similares com órgãos e entidades do Poder Público”. Visando assim, bem cumprir suas obrigações constitucionais. Dentre outras oportunidades, se poderá doravante, constituir uma equipe de licenciamento e fiscalização multidisciplinar entre vários municípios com baixo custo a cada um dos consorciados.
A LC 140/2011, resgata e empodera instituições de apoio à gestão ambiental que na prática já não mais existiam: as comissões tripartites e bipartite. Fóruns legítimos e democráticos de soluções de eventuais conflitos de competência que porventura, ainda subsistam.
A definição do caráter de supletividade é outro importante componente da Lei em questão. Da forma como ficou estabelecido, a postergação de decisão ou tomada de responsabilidade do ente federativo ante a determinada ação, ou omissão, facililita doravante, tanto ao Ministério Público Estadual, quanto ao Federal, agir na sua responsabilização. Aquele que porventura persista em se esconder por trás do limbo que até o momento se caracterizava na gestão ambiental, pela falta de clareza da competência para agir, terá agora que ser mais precavido. Isto é um forte elemento de fortalecimento do SISNAMA
Para o empreendedor, dentre outros avanços, a previsão legal de que: “As exigências de complementação oriundas da análise do empreendimento ou atividade devem ser comunicadas pela autoridade licenciadora de uma única vez ao empreendedor, ressalvadas aquelas decorrentes de fatos novos”, é a garantia de que ele não mais ficara naquela eterna idas-e-vindas, se sujeitando a interpretações em alguns casos pessoais e até mesmo ideológicas de técnicos, apresentando uma nova complementação a cada momento para obter sua almejada licença ambiental. Cabe agora, ao órgão competente pela emissão da licença, ter um bom termo de referência para nortear suas exigências legais, sob o risco de licenciar sem as devidas garantias técnicas, ficando assim, sujeito a dar explicações aos órgãos de controle externo.
Outra inovação, que muito embora, se constitui entre as medidas mais polêmicas, contida nesta Lei, é a competência de lavratura do Auto de Infração, pois: “Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada”. Em síntese, por mais falho que venha a ser um determinado licenciamento, de uma represa de rejeito industrial por exemplo, e esta vier a ruir, provocando dano ambiental, somente terá validade, o auto de Infração lavrado pelo licenciador. Neutraliza-se dessa forma algumas quedas-de-braço que comumente ocorriam nesses eventos, aonde um ente federado, agia de forma espontânea ou até mesmo provocado pelo MPE ou MPF para punir o infrator, desconsiderando e/ou isentando das devidas responsabilidades, o órgão licenciador, responsável em principio, a sanar seus eventuais equívocos.
Portanto, salvo a necessidade de se resolver algumas pendências, como por exemplo, as tipologias dos licenciamentos, esta Lei pode até trazer certa sensação de perda para órgãos de maior musculatura orgânica, como o IBAMA e alguns órgãos estaduais, mas é um caminho sem volta para que o SISNAMA definitivamente se consolide.
(*) Analista Ambiental do IBAMA/GO, especialista e mestre em Geografia. aryssantos@hotmail.com