sábado, 4 de janeiro de 2020


Artigo publicado em O Popular, Caderno Opinião, em 25.12.2019

Potencial inexplorado

Ary Soares
A geração de impostos em torno desta cadeia produtiva por si só justifica maior atenção do poder público”

Apesca esportiva segue sendo um grande potencial turístico pouco explorado em Goiás e no Brasil. É uma atividade altamente sustentável, visto basear-se no pesque e solte e dependente de uma complexa cadeia produtiva.

Uma interminável lista de petrechos; equipamentos e serviços compõem a “cesta básica” que a movimenta, distribuindo renda do ribeirinho à grande indústria. No aspecto da regulamentação Goiás está muito além da maioria dos demais Estados. Aqui, há décadas, é proibida a pesca comercial e nos últimos anos a cota zero, que proíbe o transporte de peixes de origem nativa, foi implantada. Tais medidas, em tese, propiciam maior quantidade de peixes em nossos rios e lagos.

Em uma projeção feita no âmbito do projeto de monitoramento de peixes do lago de Serra da Mesa, realizado em parceria entre o Ibama e Anepe, com apoio de pousadas, guias de pescas e pescadores, calculamos o potencial de giro financeiro de parte dessa modalidade de pesca. Serra da Mesa, mesmo sem uma política pública que favoreça a pesca esportiva, têm capacidade instalada para recepcionar no mínimo 300 (trezentas) duplas de pescadores simultaneamente, o que requer o apoio de ao menos 150 (cento e cinquenta) guias de pesca. Pela remuneração atual seriam mais de 4 milhões de reais por ano destinados apenas aos guias e isto considerando somente dois dias de pesca/guia por semana!

O movimento econômico em pousadas e hotéis; postos de combustível e outros serviços/produtos exigem projeções e tabulações mais complexas. Propusemos ao Sebrae levantar esses números, o que até o momento não ocorreu.

Consultando a home page da Goiás Turismo verifica-se que o tema pesca esportiva sequer é citado. A Goiastur e mesmo as prefeituras com tal potencial deveriam ter em sua estrutura administrativa uma área destinada ao desenvolvimento desta atividade.
A geração de impostos em torno desta cadeia produtiva por si só justifica maior atenção do poder público, e mais, o retorno em termos de maior investimento privado, ocupação e renda é garantido!

Ressalto que abordo aqui apenas Serra da Mesa. Os problemas e oportunidades se reproduzem em maior ou menor escala em todo o Estado de Goiás: Lago das Brisas; Serra do Facão; São Simão; Três Ranchos e tantos outros roteiros de pesca esportiva estabelecidos, ou com potencial para tal, carecem de atenção. O Rio Araguaia, que só enxergamos no mês de julho, é a prova cabal de nosso desleixo com este verdadeiro “filão de ouro”.

A pesca esportiva em Goiás e no Brasil carece, com urgência, de atenção e gestão por parte do poder público!

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019


Goiás, e a pesca esportiva?(*)

            O estado de Goiás, por sua posição geográfica privilegiada e detentor de grandes reservatórios de águas como os lagos de Serra da Mesa e das Brisas e de inúmeros rios, Araguaia dentre eles, tem potencial para nos elevar à categoria de “vitrine da pesca esportiva”, atraindo boa parcela deste turismo especializado, que como poucas atividades, proporciona ocupação e renda, à uma grande cadeia produtiva.

            De guias de pesca ao comércio materiais e equipamentos de pesca, são inúmeras as atividades necessárias para que esta rica e complexa cadeia produtiva se movimente, a qual se realiza em torno de um objeto de desejo que faz a alegria e emoção dos pescadores: o peixe, que é capturado e solto!

            São inúmeras as espécies, de interesse dos pescadores esportivos, que povoam nossos lagos e rios: tucunarés e piraíbas, para ficarmos em dois exemplos, estão entre os maiores atrativos para pescadores esportivos do Brasil e do mundo, atividade que se realiza em um ciclo ambiental virtuoso e economicamente sustentável.

            Infelizmente, por decisões equivocadas, normas legais que pouco contribuem para a sustentabilidade ambiental têm sido baixadas, inviabilizando o fortalecimento desta cadeia produtiva.   A Instrução Normativa 02/2019 da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – SEMADES aprofunda a já dura IN Conjunta MMA-MPA n. 12/2011 que proíbe qualquer atividade de pesca na Bacia do Rio Araguaia ao longo da piracema. A IN 02/2019, estende tal proibição ao restante do estado.

            Houvesse uma capacidade física e operacional de fiscalização e de gestão de nossos recursos hídricos, que ao menos reduzisse as mortandades de peixes como recentemente ocorreu no rio Meia Ponte, ou que coibisse a pesca predatória que dizima cardumes inteiros de tucunarés em Serra da Mesa, essas medidas, talvez fossem recebidas com melhor compreensão pelo público diretamente envolvido. Infelizmente tal capacidade inexiste, é pequeno o número de profissionais que atuam na fiscalização nos órgãos ambientais, bem como é pequeno o orçamento.

            O argumento que a proibição total da pesca, incluindo o pesque e solte, visa defender a reprodução dos peixes no período da piracema, pouco contribui de fato a tal propósito. A mera proibição atinge os pescadores e profissionais que naturalmente já respeitam as leis e a ausência deles nos rios e lagos neste período, novembro a fevereiro, contribui ainda mais para que os praticantes da pesca ilegal tenham ainda mais liberdade para desenvolver suas nefastas atividades.

            O estado do Tocantins tem agido sobre o puritanismo dessas normas. Reiteradamente eles têm baixado normas que propicia segurança jurídica a pescadores e prestadores de serviços, dessa forma a cada ano o mercado da pesca esportiva daquele estado vai se consolidando, fazendo do estado um destino seguro da pesca esportiva que Goiás, como inicialmente aqui exposto, é privilegiado detentor.

Ary Soares dos Santos

Mestre em Geografia pela UFG/GO, Analista Ambiental IBAMA/GO e ex-superintendente do órgão.





Lago Serra da Mesa, um laboratório vivo!


Ary Soares dos Santos


Após uma carreira de 36 anos, a maior parte como Analista Ambiental do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), em Goiás, aposentei-me recentemente.
Por esta e outras razões encerrei minha participação no Projeto de Monitoramento de Peixes do Reservatório de Serra da Mesa, iniciado em 2008; e que serviu como base para mudanças na legislação de pesca do Estado, induzindo na mesma a proteção aos peixes considerados mega-reprodutores.
O projeto inicial foi realizado com base em estudos genéticos, envolvendo a captura, biometria e soltura dos peixes. Parte dos exemplares, na pesquisa inicial, foram sacrificados para os estudos.
Isto permitiu saber que peixes da mesma idade podem ter tamanhos diferentes. Tal descoberta foi vital para que os pesquisadores concluíssem que a sobrepesca – que privilegiava os peixes maiores – estava induzindo o nanismo nas duas espécies objeto de estudo: o tucunaré azul (Cichla piquiti) e o amarelo (Cichla Kelberi).
Ao retomar o monitoramento, adotamos no projeto o monitoramento via inserção de tags (espécie de plaqueta com números que não se repetem), confeccionada em material resistente à ação da água, de excelente fixação no peixe e minimamente invasiva sobre o mesmo.
Guias de pesca foram habilitados na nova metodologia. Além de prosseguir à medição dos peixes, outra categoria de informação foi incorporada ao processo: o registro das coordenadas geográficas do local de captura e soltura do peixe. O tagueamento propiciou um elemento inovador à pesquisa: avaliar a taxa de recaptura!
Outro elemento fundamental propiciado pelo tagueamento – embora tenha recebido pouca atenção até o presente momento – foi poder observar que a atividade do pesque-e-solte pouco ou quase nada contribui para eventual morte do peixe.
Nas consultas feitas aos guias de pesca durante o período de aplicação dessa metodologia, não se constatou – até o momento – o encontro de peixes tagueados mortos.
Obviamente que, para o universo de Serra da Mesa, será preciso um numero muito maior de peixes tagueados para uma conclusão mais abalizada sobre esta teoria.
Os peixes recapturados, por outro lado, possibilitaram maiores estudos sobre a dinâmica de vida dos mesmos. Ou seja,  se houve desenvolvimento em tamanho e peso entre a data de captura; da marcação; da soltura e a eventual data de recaptura. Passou-se a saber se o peixe migrou no neste intervalo de tempo.
Um fato provocou muita emoção nos envolvidos: uma dupla de pescadores – pai e filho – participou da captura, marcação e soltura de um tucunaré azul.
Passado cerca de um ano, o filho voltou a pescar e capturou o mesmo peixe, a cerca de 11 quilômetros em linha reta do local onde o haviam tagueado.
Era a primeira pescaria que o filho, advogado em Brasília, realizava após a morte do pai, que havia falecido meses depois daquele dia em que marcaram e soltaram o peixe. Detalharei esta bela e emocionante história em outro momento.
Dentre outras interfaces, o projeto foi base para uma ousada e inovdora iniciativa, o Projeto Serra da Mesa: Uma proposta de redesenho curricular para as escolas da região do Lago de Serra da Mesa – Goiás.
Fruto de parceria entre o Ibama/GO e a Secretaria de Educação do Estado de Goiás – Seduce/GO, o projeto visa incluir na grade curricular do ensino médio o conhecimento gerado pelos estudos de Serra da Mesa.
Porém, por questões alheias à vontade e compromisso dos técnicos envolvidos – após ter sido formalmente apresentado às escolas da região – o Ibama perdeu o interesse no projeto.
Felizmente a Seduce/GO mantém-se empenhada na implantação dessa ação que vai – acreditamos – contribuir para melhor interação entre a região de Serra da Mesa e a população que ali habita.
Agradecemos a todos e todas que foram vitais na execução do projeto: Proprietários e funcionários de pousadas; guias de pesca; pescadores esportivos; colegas do Ibama; Associação Nacional de Pesca Esportiva (Anepe); Furnas/UHE-Serra da Mesa; Seduce/GO; Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Integrado Serra da Mesa (Cidisem); a imprensa local e estadual, pela cobertura jornalística ofertada; e tantos outros que exigiriam de nossa parte uma vasta lista de agradecimentos.
Em nome de todos os apoiadores, agradecemos à bióloga Geane Cristine Silva, atual Secretária Municipal do Meio Ambiente de Niquelândia.  Geane foi fundamental no apoio ao desenvolvimento do projeto e de seu enraizamento na região.
Ela ajudou o projeto a ecoar em outros segmentos, levando o mesmo, por exemplo, a ser grande colaborador na criação da Associação de Aquicultura e Pesca Esportiva de Serra da Mesa  (Aquamesa), associação que cuida dos interesses dessas atividades na região.
A competência profissional e compromisso de Geane Cristine foi vital para os resultados que o projeto alcançou.
Espero que o projeto tenha vida longa. E que seja, num futuro próximo, referência para o Brasil e para o mundo. Tal expectativa, porém, ainda depende muito mais da persistência do valoroso povo que habita a circunvizinhança do magnífico lago de Serra da Mesa.
Ary Soares dos Santos, Mestre em Geografia, ex-Analista Ambiental e ex-Superintendente do IBAMA em Goiás

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Violência e maioridade penal

OPINIÃO, O Popular
Publicado em 08/05/2014, página 7

Violência e maioridade penal

ARY SOARES DOS SANTOS
aryssantos@hotmail.com

A violência, que antes assustava as grandes cidades ficou crônica e se esparramou pelo País. Qualquer que seja o porte da cidade e mesmo no campo, a violência em muitos casos tem ocorrido de forma fortuita. Os nexos de casualidade que marcavam a violência e o crime contra o próximo têm se reduzido drasticamente: crimes passionais ou por vingança devem apresentar participação bem menor no porcentual geral se comparados ao longo das últimas três décadas.

O envolvimento de menores de 18 anos nas variadas modalidades de crimes também cresceu, não tanto quanto nossa percepção, mas tem sido potencializado pela violência de seus atos que associados à imputabilidade proporcionada pela legislação, os demonizam ainda mais. Este amálgama tem fomentado o debate sobre a redução da maioridade penal.

Observações de minha parte, digamos, empíricas levaram-me à escrita do presente artigo. Óbvio que o que ora exponho carece de embasamentos teóricos fundamentados na ciência psicológica e outras que têm a devida competência para destrinchar a psique humana, no entanto, na condição de cidadão, contribuo aqui com algumas considerações para, quem sabe, aguçar o aprofundamento dos entendidos na matéria.

Ante tal preliminar, julgo importante contextualizar que venho de uma época, não tão distante no tempo, em que menores de idade e mesmo crianças não eram protegidos pelas rígidas legislações atuais. Naquela época, estudar era quase uma opção; trabalhar para se manter, quase obrigação. Isso obviamente nas famílias menos aquinhoadas financeiramente. De minha parte, desde os 9 anos fui levado a sustentar minhas necessidades de vestimenta e material escolar. Lazer se resumia ao futebol de rua e de várzea. Esta era uma situação muito comum no meio em que vivia.
Com o passar do tempo, especialmente pós-ditadura e com maior força pós-Constituição de 1988, políticas de proteção à criança e ao adolescente e as necessárias políticas afirmativas foram em curto período propiciando que o Brasil superasse lastimáveis ranços colonialistas, que via no trabalho infantil, na semiescravidão do trabalhador doméstico e na disparidade de remuneração entre brancos e negros, forma de enriquecimento de uma minoria em detrimento da maioria de seu povo.

Retornando à violência gratuita que tanto nos assusta e nos priva do direito de ir e vir: bem maior da democracia, e sendo testemunha ocular da transição social que estamos vivenciando, trago à reflexão, um ponto que tem me incomodado: as garantias legais ofertadas aos jovens e adolescentes no período pós-ditadura não vieram acompanhadas, na mesma proporção e velocidade, de outras garantias, como: educação em tempo integral; lazer; esporte; cultura e tantos outros “benefícios”.

Proibir a criança e o adolescente de trabalhar é uma decisão que sempre se fez necessária, assim penso, afinal, como sabiamente dito: “lugar de criança e adolescente é na escola!”. A questão aqui, onde busco amarrar meus argumentos, é que salvo nas famílias de maior poder aquisitivo, que sempre puderam oferecer educação e lazer a seus pupilos, as famílias mais pobres ao terem que retirar os filhos do trabalho, quando muito tinham e têm como opção de ocupação de corpos e mentes apenas e tão somente o período escolar, que comumente se resume em: matutino, vespertino ou noturno. Lazer, esporte e cultura fora desses períodos eram e continuam sendo opção de poucos.

Adicione-se à discrepância de oportunidades entre as classes sociais, o fato de que as famílias mais abastadas sempre tiveram a seu alcance, além da ocupação integral de seus filhos, o acesso à orientação psicológica e pedagógica para os eventuais desvios de condutas e, se falhasse tal orientação, a defesa jurídica, remunerada e personalizada, sempre foi mitigadora de penalidades. Discrepância esta que proporciona enorme diferença entre atos da mesma tipificação penal com a resposta do Estado em sua punição.

As prisões, abarrotadas de pobres, é clara comprovação da diferença de tratamento aos penalizados. Outro parâmetro, mais duro, seria verificarmos quantos jovens perdem a vida em conflitos com a polícia ou por disputas de poder nas favelas e bairros pobres em comparação com as mesmas perdas nos condomínios fechados e bairros nobres. Imagino que são estatísticas estarrecedoras.

A educação, cultura e esporte são em si, elementos de democratização do acesso à qualidade de vida. Infelizmente apenas recentemente o Estado começou a oferecer educação em tempo integral. Um curso em tempo integral, ao estilo Senai era uma referência, visto que além do curso profissionalizante oferecia tudo que uma escola em tempo integral deva oferecer, incluso acompanhamento psicológico. Parte de minha adolescência foi em uma dessas instituições, o Ítalo Bologna, que era gratuito e que tinha à época um filtro que limitava acessos, o tal exame de admissão.

Faltou e ainda carece de maior atenção da sociedade a oferta de oportunidades socioeducativas às crianças e adolescentes, independente de capacidade financeira e origem social. Não resolvida esta questão, debater maioridade penal é apenas debater o problema, adiando a solução.


Ary Soares dos Santos é mestre em Geografia e analista ambiental.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Transporte coletivo, alternativas.

Publicado no Jornal O Hoje (http://www.ohoje.com.br/pageflip/1800/index.html - edição de 05/10/11, pagina 4)

No ultimo dia 27, publiquei nesta coluna, artigo intitulado “transporte coletivo: relatos de um dia”. Externei naquele momento parte das dificuldades cotidianas daqueles que por opção ou por falta, tem nesse meio de mobilidade uma alternativa. Recebi de alguns leitores considerações que reafirmaram minhas observações quanto à experiência vivida. Retomo aqui o tema, agora submetendo uma proposta que imagino, possa contribuir na reflexão pela busca de soluções.
Sem entrar aqui de forma aprofundada nas estatísticas, temos que, somente em Goiânia circulam aproximadamente um milhão de veículos. Indo direto ao ponto (não ao ponto de ônibus, ao menos por enquanto...) se taxarmos esta frota com fins específicos para melhora das bases do transporte coletivo, faremos uma revolução em poucos anos, acredito.
Criar uma nova taxa, seja lá para o que for, é sempre visto como um ato impopular, especialmente em um país como o nosso que tem, segundo economistas, uma das mais pesadas cargas de impostos do mundo. Mas atenção, o que proponho aqui não é imposto, é uma taxa a ser aplicada exclusivamente sobre veículos automotores não utilizados em transportes coletivos.
Imaginem que se estabelecermos que cada veículo motorizado passe a pagar uma bagatela de em média R$ 100,00 (cem reais) ao ano para este fim, um milhão multiplicado por 100, resultaria em 100 milhões de reais ao ano. Tais valores, por princípios democráticos poderiam ser distribuídos por uma média de paridade por potência do veículo, poder-se-ia iniciar com um piso de R$ 50,00 até um limite de R$ 200,00, mesmo assim acredito que chegaríamos facilmente a este valor. (Proponho que técnicos da área de estatística articulem melhor números, especificações e valores).
Segundo estimativas recentes, o modo de transporte coletivo conhecido por VLT (Veículo Leve sobre Trilho), que se encontra em estudo para implantação em Goiânia, custará entre 20 a 30 milhões de dólares por km, nesta singela conta, a cada ano apenas com esta taxa, poderiam ser implantados até 5 km desta modalidade de transporte. Este valor, oriundo da taxa aqui proposta, entrando como contra-partida de recursos de governos, poder-se-ia no mínimo duplicar, duplicando também a quilometragem a ser implantada.
A proposta não é isentar os diferentes níveis de governo de suas responsabilidades, mas sim, propiciar à sociedade, formas de contribuir de forma objetiva na solução do problema. Aliás, tais recursos, se a taxa for aprovada, deve ser administrado por um colegiado e não pelo Governo. Será um recurso da sociedade e não deverá ter o carimbo de “verba pública”.
Um transporte coletivo de qualidade (segundo especialistas) contribui para tirar milhares de veículos individuais das ruas (seus proprietários passam a ter no transporte coletivo uma alternativa de fato viável e não apenas uma manifestação política aos moldes do retumbante fracasso: “um dia sem carro”). Por outro lado, aqueles que de fato dependem do uso de carro, passam a ter um trânsito bem menos estressante, e a economia que se alcança na diminuição do desgaste do veículo, gasto com combustível e maior facilidade de estacionamento, supera com sobras um pequeno investimento como aqui proposto ao longo do ano.
De minha parte fica a proposta que, obviamente, carece de aprofundamento e consulta pública. Quem dentre nossos representantes políticos levantará esta bandeira?

Ary Soares dos Santos

Analista Ambiental do IBAMA em Goiás, Especialista e Mestre em Geografia.

terça-feira, 19 de março de 2013

Chuvas não é sinônimo de catástrofe





Publicado no jornal O Popular, Caderno Opiniao, em 27-01-2003


Ary Soares dos Santos (*)

O monge beneditino d. Eric James Deitchman, norte-americano de nascença e goiano por opção, dedicou a maior parte de sua vida tentando conciliar as ambições humanas com a manutenção dos aspectos ecológicos, costumava dizer que “(...) uma das poucas coisas que recebemos inteiramente de graça são as águas das chuvas, e não as valorizamos (...)”.
Dom Eric viveu em Mineiros, Sudoeste de Goiás, onde levava a efeito seus atos monásticos. Viveu como poucos o pretenso desenvolvimento sustentável. Teve indiscutível contribuição no desenvolvimento econômico da região, lutou pela valorização do ser humano e foi pioneiro na defesa ambiental. Ele criou e presidiu a Fundação Emas e defendia, com conhecimento de causa, uma moratória para o cerrado: desmatamento zero.
O início, ou melhor, o transcorrer de cada estação chuvosa renova sempre a saudade de d. Eric. Não valorizamos as chuvas, e as mesmas, ano após ano redundam sempre em catástrofe mundo afora e o Brasil se mantém fiel neste noticiário.
Deslizamento de encostas, rios e córregos transpondo seus leitos. Fenômenos previsíveis que provoca efeitos colaterais que bem conhecemos: rodovias bloqueadas, pontes arrastadas, plantações inundadas, moradas destruídas. Perda de vidas humanas se associam quase que automaticamente a estes acontecimentos, que resultam em grandes prejuízos financeiros a particulares e ao governo em seus mais diferentes níveis.
O noticiário comprova que tais eventos não são exclusividade brasileira. China, Estados Unidos, Europa enfim, o mundo convive com estes aspectos da natureza. O Brasil, por suas dimensões físicas, riquezas naturais e leis ambientais existentes poderia ser diferente, deve ser diferente.
Detemos uma extensão física invejável – “somos um dos maiores países do mundo”. esta área associada a condições naturais ímpares, nos posiciona como um país megadiverso em riqueza biológica. A área física em si deveria ser suficiente para um planejamento habitacional, onde no mínimo fossem evitadas as tais “áreas de risco”. Se evitaria assim, entre outros dissabores, perdas humanas. Por outro lado tais áreas não sendo ocupadas, contribuiriam para uma maior sobrevida de nossa flora e fauna. Ganharíamos duas vezes. Praticaríamos de fato, parte do que preconiza uma boa política ambiental.
As leis ambientais necessitam de pouco ou de nenhuma adequação. Ela, por si só já é uma espécie de contrato social. Falta, infelizmente, determinação em cumprir tal contrato. Entre tantas cláusulas, este contrato social é claro na defesa dos aspectos sociais ao proibir a ocupação de áreas de risco, visto que tais áreas são nada mais, nada menos, que as denominadas áreas de preservação permanente (encostas com acentuada declividade; nascentes e margens de córregos e rios são algumas das áreas contempladas neste quesito).
Este ato: a defesa inconteste das áreas de preservação permanente, como dito, já previsto em lei. É apenas um exemplo de como o mero cumprimento da lei já seria um importante atenuante, tanto na proteção de natureza, quanto na proteção de seres humanos.
O respeito à inexorabilidade previsível da resposta da natureza às nossas formas de uso e ocupação, são vitais para que deixemos de freqüentar o noticiário enquanto catástrofe. Tempo chuvoso, não é tempo ruim como é noticiado. Ruins são nossas práticas sócio-ambientais.
(*) analista ambiental do Ibama/GO